América Latina: Uma Arte Nossa para o Mundo Inteiro

Memorial da América Latina
Estou trazendo aqui uma síntese que fiz do texto que o curador Jorge Glusberg escreveu para a II Bienal de Artes Visuais do Mercosul. Nele são tratadas questões relacionadas à nossa arte, ao regionalismo, às ligações existentes entre as culturas latino-americanas e o desenvolvimento de uma arte que no início apenas importava modelos e que com o tempo foi se utilizando das linguagens universais para transformá-las de acordo com as suas culturas locais, fazendo com que novas ramificações fossem aparecendo e contribuíssem para a arte mundial. Nesse processo novamente na história da arte aparece a dualidade entre o clássico e o barroco.

Por fim, a questão do Mercosul como meio de integração de países que, apesar de suas diferenças, tem em seus históricos processos de exploração de seus povos e que precisam divulgar as suas culturas:

"I. Nas últimas décadas, a arte latino-americana conquistou seu lugar no mundo.

II. O pensador mexicano Edmundo O'Gorman preferiu falar da "Invenção da América", ao estudar o processo iniciado em 1492. O processo também foi denominado de "encontro de dois mundos".

III. De invenção histórica a América passa a ser então uma criação cultural.  A miscigenação natural foi sucedida pela miscigenação cultural. A arte americana traçou duas grandes avenidas: a cultura do surreal e a cultura do racional. O barroco latino-americano é expressão maior da 1ª, o neoclassicismo aqui re-elaborado, representa a última. Ambas as orientações já estavam presentes nos modelos dos dois mundos. Mas nessas terras é que elas conseguem se firmar e adquirir perfis próprios.

IV. Para a América Latina, o séc. XIX representa a desintegração cultural nas artes plásticas e na arquitetura, com meras importações de modelos. Há poucas exceções, como o pintor argentino Candido López. Entre o final do séc. XIX e começo do XX se ouvem, na cidade do México e em Buenos Aires, as primeiras vozes de incitação nacional: dr. Atl, Martín Malharro e o Grupo Nexus, estimulam uma arte local sem xenofobia, mas também sem submissão. Na segunda metade da década de 10, em Montevidéu, o uruguaio Pedro Figari dará o passo que estava faltando: vai do nacional para o americano, com sua teoria sobre o regionalismo.

Candombe, 1921, óleo sobre tela, 75 x 105 de Pedro Figari
V. O terreno era propício para a divulgação do regionalismo. É o começo do modernismo na América, porém um modernismo diferente do europeu e do norte-americano, porque é o único caso até então regionalista.

VI. O uso das linguagens internacionais para abordar as problemáticas locais teve valiosas ramificações e contribuiu de forma significativa para a arte contemporânea do mundo.

Embora tardiamente, a integração política e econômica avança a partir do Mercosul. Mas o que acontece é que acentuamos as divergências, nunca as concordâncias, o que atrasa longamente a unidade regional. Quais são as benditas diferenças se ainda subsistem em alguns países vestígios de autoritarismo, de desigualdade, de estagnação, de atraso, de miséria? Sobressaímos mais pelo acúmulo de analogias. E quem negará as verdadeiras diferenças, as da geografia, das riquezas naturais, da superfície.

A integração cultural também não extingue a variedade: apenas a preserva, incorporando-a à somatória de suas vivências e propostas."

Fonte:
GLUSBERG, Jorge. América Latina: uma arte nossa para o mundo inteiro. In: II Bienal de Artes Visuais do Mercosul: catálogo geral. Porto Alegre: FBAVM, 1999. p.25-31.

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